Os Anos 70/3 – Um pouco de terror
Um dos melhores mangás yuri dos anos 70, na minha opinião, é Maya no Souretsu (O Funeral de Maya – 1972) de Yukari Ichijou. Trata-se de uma história de terror gótica com muitos assassinatos e vingança, com um roteiro, um pouco ingênuo, verdade, que parece feito sob medida para virar filme.
Maya no Souretsu também é um one shot, assim como Shiroi Heya no Futari e conta a história de Reina que durante as férias de sua família no campo conhece a misteriosa Maya e se apaixona por ela. Reina tem um casamento arranjado pela família com um bom moço bonitinho, mas é por Maya que seu coração começa a bater de verdade. Enquanto o tempo passa, várias pessoas da família de Reina e próximas a ela são assassinadas de forma brutal. Maya parece saber demais sobre a família de Reina, coisas que a menina nem sonha e que justificam toda a violência que explode ao seu redor. Na verdade, tudo tem a ver com uma terrível vingança e Maya está no centro dela. Terminamos de novo em tragédia…
Yukari Ichijou é uma das mangakás mais reconhecidas de sua geração e a favorita de Naoko Takeuchi, autora de Sailor Moon, Maya no Souretsu foi somente o seu primeiro mangá yuri, mas a autora tem uma produção das mais variadas e desconhecidas no Ocidente. Ano passado, ela esteve em evidência graças aos doramas, mas animê em cima de suas séries, nenhum.
Depois dos Anos 70: Menos tragédia e um pouco mais de felicidade
Ainda que a tragédia continuasse a rondar os casais yuri, a coisa começou a se tornar mais solar nos últimos 30 anos. Temos muitas histórias mal resolvidas, mas o fato é que as histórias com conteúdo shoujo-ai ou yuri não precisam mais ter um final infeliz ou serem marcadas pela tragédia.
Acredito que a grande virada se deu com Paros no Ken (1987), que pode ser visto como uma releitura da Rosa de Versalhes. Paros no Ken é baseada no primeiro de uma série de romances escritos por Kaoru Kurimoto, especializada em histórias de fantasia e terror. Já a quadrinização ficou por conta de Yumiko Igarashi, desenhista conhecida mundialmente por Candy Candy.
A história se passa no Reino de Paros, em uma suposta Grécia medieval (existe efetivamente uma ilha de Paros por lá). A herdeira, Hermínia, prefere se vestir com roupas masculinas e é o melhor espadachim do Reino. Ela tem um fiel companheiro, Yurius, que é profundamente apaixonado por ela e a segue como uma sombra. Pressionada para se casar, tendo se reino ameaçado por inimigos, ela se apaixona por Fiona, uma jovem camponesa órfã. Aqui não somos enganados, Fiona sabe que Hermínia é uma mulher desde o início, as duas se amam, as duas lutam contra tudo e contra todos para ficarem juntas, Yurius se sacrifica pela princesa, mas não tem jeito… É uma obra realmente corajosa e dessa vez não temos uma heroína se lamentando, ela vai em busca do que quer. A história termina em aberto, nós é que decidimos o final.
A partir daí as obras yuri ou com algum conteúdo yuri se multiplicam e não tem limites de faixa etária. Afinal, qual o casal de lésbicas mais conhecido dos mangás e animês? Michiru/Netuno e Haruka/Urano de Sailor Moon (1992), mangá publicado na revista Nakayoshi que é para meninas de 9 a 13 anos. Aliás, o casal yaoi foi invenção do animê que é de novo uma releitura masculina do original.
Outro mangá yuri que saiu em uma revista para a mesma faixa etária, a Ribon, é Himitsu no Hanazono (O Jardim Secreto – 1999) de Fuji Mihona, a autora do bem mais famoso Super Gals! Kotobuki Ran. Trata-se de um one shot o qual Misono, uma menina que sofre uma imensa pressão da mãe para se tornar uma grande atleta, conhece o rapaz ideal e se apaixona… Só que ele é ela. A menina, no entanto, não se importa e, claro, não posso comentar muito mais sem dar imensos spoilers. Um bom mangá, muito sensível, mas que no início recorre ao mal entendido para se sustentar.
Poderíamos engrossar a lista comentando Card Captor Sakura (1996) e o akogare de Tomoyo pela protagonista. É outro mangá que saiu na Nakayoshi. Aliás, muita gente só lembra da CLAMP para falar de sugestões yaoi, mas as meninas são igualmente generosas quando o assunto é yuri/shoujo-ai. Querem um exemplo? Em X (1992), Tooru e Saya eram amantes e uma se sacrifica pela outra. Ambas são casadas, ambas têm filhos, mas o amor verdadeiro é compartinhado entre elas. É uma radicalização da paixão da mãe de Tomoyo pela de Sakura, afinal, Card Captor Sakura precisava ser light, coisa que X está longe de ser.
Outras autoras que fazem yuri mangá de verdade em revistas mainstream são Reiko Momochi de Confidential Confessions (vol. 4 tem uma história yuri, aliás), Érika Sakarazawa e Nanae Haruno (Pieta e Double House). Outras como a CLAMP, Chiho Saito (Shoujo Kakumei Utena) e Naoko Takeuchi fazem visitas. E o grande hit é com certeza Maria-sama ga Miteru com seus livros, mangá na Margaret e animê com três temporadas.
De forma explícita, ou não, apresentado como uma amizade ou envolvendo sexo, visto como ritos de passagem, tendo final feliz ou trágico, os relacionamentos entre mulheres estão sempre presentes dentro do shoujo mangá. Agora, quando o assunto é animê shoujo a coisa vem sempre um pouco velada ou não vem, já que boa parte dos mangás com essa temática não são animados. Claro que não existe regra nesse sentido e os anos 90 tiveram como mostra o Shoujo Kakumei Utena, principalmente o movie, e Sailor Moon.